Às vezes parece que vai outras vezes que não... é a dicotomia da vida
dizendo que somos quase prontos. Quase equilibrados. Quase vivos. Uns
que passam sobre a gente, outros que dão a volta e contornam como se
fossem sombras de si mesmos.
Essa vida é mesmo surpreendente. Em
uma única existência somos capazes de viver e sobreviver a diversas
fases, sob a sorte e a falta dela que nos unge os dias. De uma forma
concisa eu poderia dizer que viver é uma sucessão de erros e acertos, de
tropeços e saltos, afogamentos, resgates, onde só desfrutamos e
valoramos as subidas depois que despencamos ladeira abaixo. E como toda
história tem dois lados, na vida não poderia ser diferente. A gente só
percebe a vitória e a derrota quando estamos no topo, ou no poço.
Acredito que nós, seres humanos, somos providos de uma força
sobre-humana para aguentar tanta pedrada que a vivência insiste em
mandar. É incrível a nossa capacidade de cair e levantar, de reformular
por dentro, sangrar e estancar, ressurgir. Somos feitos de partículas de
persistência, átomos de dedicação, moléculas de crença, células de
esperança. Quanto mais nos entregamos e mergulhamos em nossos motivos,
mais reforçamos o nosso propósito de viver. Acontece que, vez ou outra,
vem uma paulada pelas costas, um tombo violento e esparramado, uma bala
perdida que nos encontra na escuridão. Então morremos. Para, depois,
nascermos de novo.
A vida é cheia de ciclos… E para começar um é
preciso encerrar o outro. Por isso morremos tantas vezes durante tantos
anos. A prova viva da morte está no fim excruciante de um relacionamento
amoroso, no vazio assustador do abandono físico, na escassez de alguém
ali, que nos ame, ou que ao menos nos suporte. Está na falta de emprego e
perspectiva, na despensa vazia, na ordem de despejo, na saúde
fragilizada e apavorada, na despedida de uma alma querida. Quando
perdemos tudo, o que nos resta é recomeçar do nada. Precisamos morrer
para renascer, assim como o mito da Fênix, que antes da sua morte
entrava em combustão para depois renascer das próprias cinzas. Somos
assim. Aves tão fortes que conseguimos carregar elefantes. Nossas
lágrimas não só expelem alívio, como também têm o poder de cura.
A
verdade é que os golpes da vida nunca são gentis, muito menos educados
ao ponto de anunciar a chegada. Ao lançar-nos no chão parece que um
buraco se abre e nos engole, mastiga, degusta e então, cospe. Do que
sobra de nós é preciso dar forma e pôr de pé. Morre um para nascer
outro, indiscutivelmente mais resistente. Desse jeito, toda vez que
recebemos uma pancada desnorteante nos despedimos de um pouco de nós, um
fio de esperança se perde, um bocado de confiança vaza, um tanto de boa
fé escorre. É possível que nos recuperemos adiante, embora algumas
vezes isso não aconteça. Morremos.
Como a Fênix, cessamos em
nossa auto cremação de dores, de ódio, indignação e sensação de
incapacidade, um mistura de venenos que nos corrói e nos traz de volta à
terra. É com base na junção de algumas mortes passadas e futuras vidas
que eu digo: Deve-se cortar para florescer, é preciso morrer para voltar
a viver.
Então, do pó ressurgimos, amedrontados, cambaleando,
abrindo os olhos e as asas, sacudindo a poeira. Enchemos o pulmão de ar
para arriscar um primeiro voo, ainda contido e baixo, mas consumidos de
uma força maior acreditada em nossas capacidades e virtudes. Aos poucos,
nos enchemos de esperança e de coragem para alçar novas manobras e
riscar outros horizontes.
Não adianta. A nossa força oriunda das
quedas. É por isso que as feridas são imprescindíveis para o
crescimento, por mais que nos regalem certa rigidez ao casco. É a
capacidade de recomeçar dentro de nós mesmos que nos permite viver outra
vez. Somente dessa forma recuperamos a nossa vida.
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