sábado, 26 de março de 2016

Quando um adulto aprende a ser criança

Quando um adulto aprende a ser criança
Eu acho que não exista na vida perfeita, obra tão magnânima quanto a pureza de uma criança
Se tiver, Deus escolheu para ele possuir
Sempre que chego na casa de Sophie para vê-la é um tal de gruda e não solta mais
Chego a ficar até 5 horas com ela nos braços ou brincando em qualquer lugar
Pego os 03 brinquedos: Teddy, Lion, Piu Piu e dou para ela morder, bater ou jogar em mim.
Mas, dentre essas coisas todas, o início de nosso contato, é o que mais me chama atenção.
Quando chego ao sábado, geralmente estou o monstro na figura humana.
Barba por fazer, olheiras profundas de uma semana de 110 horas trabalhadas, a roupa já começa andar sozinha comigo dentro. Não estou só cansado, mas trago dentro toda uma bagagem de situações que ocorreram ao longo da semana.
Daí a pego no colo e a primeira coisa que ela faz é tomar distância, colocando as duas mãos no meu peito e se afastar, olhando fixamente para mim, com a cara de “Quem é ele?”.
É surreal, muito engraçada. Umas três vezes, ele repete esse gesto.
Daí percebo como devo estar feio para minha filha. Como devo estar passando uma energia diferente do que ela recebe da mãe e irmãos e toda família que a trata muito bem.
Meu único jeito e razão de conquista-la é fazer aquilo que nós adultos perdemos quando crescemos: - Verdadeiros
Somos relapsos: Esquecemos dos outros
Somos viciados: Pensamos só em nós
Somos imprudentes: Diminuímos a importância das pessoas
Somos craques: - Em dar desculpas
De um modo eu tiro a máscara tola que guardo como se fosse o meu maior tesouro; achando que me sirvo bem dela, e passo a deixar a pessoa de dentro falar.
Mudo a voz para personagens infantis, canto as únicas duas músicas que eu sei completas:
Atirei o pau no Gato
Parabéns para você
E tento fazer com elas um show musical para Sophie. Canto, bato palmas, imito o gato e vejo a minha filha ainda olhando para mim, como se eu fosse um desconhecido.
Lógico que Sophie tem sete meses e não poderia ser de outro modo, mas a gente sabe o que ela mais gosta: Ir para rua e ver o movimento das pessoas e dos carros. Sentir a brisa no rosto, olhar o céu, rir com as plantas. Minha filha tem uma alma de povo livre. Assim como minha Mikha tem de escritora. Dou a ela meus braços e abraços. Pernas e toda força que meu corpo grande, sustentado por uma coluna velha pode dar. A gente se encontra de fato nessa hora. Ela se lembra de quem eu sou, e canta comigo as mesmas duas músicas. Espera a hora exata do “miau” para também fazer na vozinha dela. Ou bate palmas no meio da canção de Parabéns para você.
Quando finalmente vou sentar e coloco os 03 brinquedos favoritos dela, tá uma pessoinha mudada. Ela fica toda relaxada e confiante que vou brincar até ela ficar com sono. Cantaremos juntos todas às duas canções que seu velho pai sabe. E quando o moço da rua da frente ligar o som no mais alto volume, colocando seu forró antigo ou as músicas do tempo do ronca, a gente vai dançar. Eu de novo vou pra frente da casa e ficamos desavergonhadamente dançando um forró que só eu sei dançar ou balançando de lado em um momento Altemar Dutra, Valdick Soriano. A minha filha acaba por se render e dorme... Um sono profundo, que vejo a chupetinha dela cair.
Daí então percebe-se o quanto tempo se perde tentando ser bruto. Tentando ser adulto demais. Bitolado demais. Agindo como se fossemos nós os únicos seres da terra a ter problemas e cansaço. Adoramos as pechas de “sinceros demais, chatos, brabos” e quando muito, adoramos nos salvaguarda de todos, colocando-nos acima dos sentimentos alheios.
Crescemos colhendo desculpas para tornar uma criança em um adulto bipolar
Catamos pedras para nos armamos toda vez que alguém ousa passar da linha amarela demarcada.
Eu sei, soa “excessivamente romântico!”.
Mas, não vou me desculpar por isso! Os meus sentimentos não são mesquinhos, ao ponto de me achar pronto para vida.
Eu também percebi que Sophie na semana que vem vai me esquecer de novo. As mesmas caras e bocas que eu vi, ela vai repetir. As mesmas desconfianças quanto ao homem na sua frente eu vou rever dela. Mas, também sei que posso muito bem mudar e voltar a ser o bobo dela. O cara que só faz bobagens e gracinhas; ao ponto de criar nela a expressão tão sincera quanto verdadeira: “Água mole em pedra dura – tanto bate até que fura”.
Daí quando ela estiver bem cansadinha, vai receber meus braços e abraços: sincero isso eu posso dizer. São sinceros e verdadeiros, tanto quanto eu posso tirar de mim essa alma de criança. No que me tange ao adulto? Tenho cá com meus botões que fica difícil um adulto se soltar e ser feliz de novo, usando só máscaras. Gostaria que um dia tudo que fosse “excessivamente bom” não tivesse a conotação de ruim. Eu, você e quem quer que leia essas palavras, sabe que o caminho que escolhemos é o que chegaremos ao final. Eu quero chegar com pessoas que sintam minha falta; não necessariamente pelo que eu sou, mas pelo que posso ser.

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