sábado, 26 de março de 2016

Flash Black 42 anos

Flash Black 42 anos
Hoje acordei pensando na vida...
Como se isso fosse algo anormal, penso todos os dias, mas pensei mais porque acordei 5 da manhã com um zap da minha filha desejando feliz aniversário.
Dai lembrei de você que me ensinou a querer escrever.
Mulher ativa, decidida e atrevida sempre foi um marco e um pesadelo para mim.
Fui numa festa em Cajazeiras e nessa festa de rua eu fiquei 2 dias e meio. Na última noite, conheci uma menina que se chamava Kassandra. Kassandra me detectou no meio da multidão. Linda sim. Atrevida toda.
Kassandra mandou por um menino desses fuleirinhas de festa perguntar meu nome. Eu que já havia superado a minha timidez de infância, parei e a observei na festa. Linda - extrovertida - sorridente. Eu perguntei a mim mesmo: - Ué comigo?
Sim era comigo mesmo!
Gente! Eu sou uma porta em matéria de mulheres que paqueram primeiro. Me desarmo todo, perco as palavras, o raciocínio, viro moleque de novo. Não consigo me soltar. E lá esta aquela moça, passeando, transitando pelo povo com as amigas, vire e mexe: olha para mim e sorri.
Faz beicinho. Chama para dançar.
Eu não cedi. Fiz de conta que não observei e ao mesmo tempo fiquei sem chão literalmente.
Não era frescura. Era simplesmente que eu temia enormemente tropeçar nas palavras e decepcionar aquela moça que me cantava descaradamente. Eu temia ela perguntar meu nome e eu dizer: macarrão. Algo assim bem esdrúxulo e estapafúrdio.
Isso foi por muito tempo. Eu com os amigos me escondendo com vergonha de ser um infeliz tapado e ela com as amigas do outro lado da barraca rindo e fazendo caras e bocas, entre olhares.
Contei todas as passadas de mãos de cabelo que ela fez.
Todas as cruzadas de pernas, sentadas e levantadas.
Ela poderia imaginar que eu tava de desdém, mas era pavor mesmo.
Até que uma determinada hora, ouve um início de briga na barraca ao lado, e os amigos do deixa disso entraram logo e evitaram o pior. Quando fui procurar ela, lá estava a moça ao meu lado, dizendo assim: - Esse povo vem para brigar né...
- Éeeeee , eu disse
Isso me remeteu ao jardim de infância com 7 anos.
Lá estava minha vida toda pela frente ainda, sentado todos os dia no recreio com aquela menininha de cabelos presos, tipo japonesinha dividindo seu lanche comigo, sem eu nunca ter pedido.
Aquela menina dizia que a mãe dela falou que ela já era uma mocinha e que quando tivesse um namoradinho, tinha que falar para a mamãe.
- Eu disse para minha mãe que já tenho um namorado
- Eu calado ficava, calado permanecia
Ela tagarelava pelos cotovelos, como se fosse um passarinho a cantar sem parar. Eu nunca dizia nada, mas era um bom ouvinte. Acho que surgiu daí o hábito de ouvir as mulheres. Rita era bonita, mas eu não sabia as palavras certas para dizer... então dividíamos ou trocávamos os lanches. Um dia era pão com ovo outro pão com goiabada e queijo. Nosso pequeno namoro de infância só era regado pela fome da Rita e pela capacidade de dizer tudo que ela fazia em casa e na escola apenas num curto espaço de tempo.
Kassandra sorriu e insistiu em puxar o assunto. Nunca naquela noite ela me perguntou se era tímido. Reprovou-me ou disse nada à respeito da minha recusa de aproximação.
Ela como eu imaginava, tinha conversa suficiente para nós dois. Falava e me curtia calado.
Nossa noite terminou com o dia já raiando. Nós sentados um de costas para o outro, colados se ajudando no equilibrio do peso das costas, e roçando a cabeça rindo.
Eu vi a noite ir embora, ouvindo a sua vida. O quanto queria ser médica em Fortaleza. O quanto era irritante a sua irmã mais velha que já tinha se apoderado desse sonho também.
Eu desabafei aqui e ali alguns sonhos, nada muito importante.
Terminamos nos despedindo na rodoviária, pois eu tinha de ir embora naquele dia.
Kassandra meu escreveu durante os meses seguintes 5 cartas longas e bem escritas e detalhadas. Eu jamais respondi. Tinha vergonha de não ser altura daquela brilhante futura médica.
Mas, com toda certeza Kassandra eu aprendi a responder as suas dúvidas. Hoje eu sei escrever por você.

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