Demorei muito para te escrever, procurei ser sincero, como estou
sendo hoje, porque a percebi comigo na minha mente, quando liguei o som do
carro para vir trabalhar. Eu tive por 20 anos uma cliente que se tornou uma
amiga, não que tenhamos qualquer amizade além da loja, mas ela viu neste
ínterim todas as minhas fases... Do início de projetos ao fim dos mesmos. Minha
amiga Ceiça, hoje a música me fez lembrar você – ouvia a playlist do anos 80,
quando percebi que meu pensamento remetia aos seus pedidos malucos para comigo...
- Alexandre! Faça meu DVD de fotos musicada, toma aqui o cartão da
máquina. Quero um backup das fotos e um DVD com música “bem bonitinhas que você
sabe meu gosto qual é... (...)”. Eu sabia sim, temos gosto parecido, só que as
fotos eram em torno de 700 e até o exagero de 1000 fotos por viagem. Começava
aqui nossa desavença! Eu dizia que isso era maluquice: “ Vou levar 5 horas
fazendo um só DVD”, tu não dorme não, Ceiça? – Ela brigava comigo, mas no fim,
ria...
Ceiça a vida toda amou fazer apenas de duas coisas: Viajar e bater
fotos! Teve o disparate de nas duas perdas pessoais recentes, como as mortes do
pai em primeiro e depois a mãe, de me pedir para fazer um DVD deles no caixão (
???). Eu já sabia que a família tinha freado, mas ela escondidinha ultrapassava
as fronteiras... Ceiça era assim, doa a quem doer...
Ceiça teve câncer cinco anos do falecimento, esse era o retorno da
doença, mas desta vez, conseguiu leva-la muito cedo, na flor da idade para quem
tinha 50 e poucos, cheios de muita vontade de registrar tudo. Quem nos via negociando,
dizia que era briga feia - só Deus
apartava, mas para gente era só bullyng um com o outro, porque da nossa
relação, pegar no pé era o troféu preferido.
Ceiça me fez lembrar-me de meu irmão e de todas as pessoas que vão
embora cedo. Já reparou que eles têm uma sede de contar o que seus olhos viram?
Parece que precisam respirar mais rápido, correr, apaixonar-se e sentir o mundo
mais profundamente do que qualquer um. Quem sente a vida como eles despedem-se
todo dia um pouco...
Eu só soube de supetão sua morte, sem avisos, mas imagino que as
suas quase 50 mil fotos, estarão todas compartilhadas na mente e nos corações das
pessoas. Ceiça não nasceu com o boom das redes sociais; achava muito chato e
difícil de mexer com esse “troço”; coisa incrível isso! Até porque é justamente
uma época em que as pessoas registram e publicam fotos de pratos e tudo que
fazem em suas redes sociais. Mas, ela preferia correr o risco da máquina
quebrar ou o filme queimar do que perder a oportunidade de não ter ido aonde
ela queria estar. Minha amiga era de chorar rios de lágrimas por um cartão de
dados perdido. Já chegou a me esganar por não ter uma cópia de algum DVD que
ela tinha perdido. Eu sempre achei que era um modo de vida maluco, hoje não
penso mais – ela conseguiu fazer com que eu achasse bom, alguém justificar as
cores da vida tirando fotos. Se para ela que tinha estado nos locais nos quais
tirou as fotos, mas mesmo assim, curtia chamar as mesmas amigas de viagem para
reverem as fotos, em DVD player com 2 horas de duração... Quem sou eu para
achar ruim qualquer coisa? Eu só posso me lamentar de não despedir-me... Resolvi
hoje: Dizer que senti sua falta quando ouvi você em meu ouvido cochichar : “ Ei
aqui eu já bati um monte...”
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