quarta-feira, 20 de julho de 2011

O poeta que amava Peido!

 

joyce

nora

Apesar de ser um post chamativo, o cara que quero retratar aqui é James, Joyce - Um dos maiores poetas do século XX, autor das obras:  Dublinenses/Gente de Dublin (1914) e os romances Retrato do Artista Quando Jovem (1916),Ulisses (1922) e Finnegans Wake (1939) - o que se poderia considerar um "cânone joyceano". Ele escrevia romances como ninguém. Lendo umas das 3 cartas que ele enviou para sua esposa e outra para amante, dá pra sacar logo de cara que entre poeta e gênio, tem um sacaninha no meio de tudo. O cidadão era chegado ao coito anal, e cheirar pedio. O que por só isso, já deixaria qualquer mulher estarrecida; mas não suas mulheres, que com igual volúpia, retornavam suas cartas ora picantes com tamanha indecência, que dava para pensar, se não era sua alma gêmea do outro lado da escrita. Essas cartas de foro intimo, foram lançadas após sua morte pelo escritor e biógrafo Richard Ellmann.

 

Veja o Conteúdo:

        Joyce, James. Cartas a Nora. Massao Ohno-Roswitha Kempf Editores, São Paulo, SP, 1982.

 

"É estranho ver de que mares de lama os anjos fazem surgir um espírito de beleza", afirma Joyce, ao comentar uma canção para alaúde, escrita pelo devasso rei da Inglaterra, Henrique VIII. Para nós, ao contrário, não há nada de estranho em perceber, através de suas cartas, como a beleza e a devassidão podem caminhar juntas, produzindo frutos que, preservados para a posteridade, não só revelam a fácies de um brilhante escritor, como também o que de mais íntimo ele desfrutou ao lado da companheira de toda a sua vida.

        "Não fui eu quem primeiro te bolinou há muito tempo em Ringsend", escreve ele, ao recordar os primeiros dias de namoro. "Foste tu que enfiaste a mão lá embaixo dentro de minhas calças e empurraste de leve minha camisa e seguraste minha pica com teus dedos compridos e comichentos e foste aos poucos agarrando-a toda, dura e gorda como estava, com tua mão e me bateste punheta devagar até que eu gozasse entre teus dedos, debruçada sobre mim todo o tempo e fitando-me com teus olhos tranqüilos que parecem de santa."

        Assim era Nora, tão voluptuosa quanto Joyce, "de espírito simples, excitável, de voz grave, sonolenta e impaciente", a quem ele chamava, nos momentos de carinho, de "minha adorada menininha de convento" ou "minha colegial travessa de olhar lânguido" e, nas cartas mais sensuais, "minha amantezinha punheteira, minha putinha fodedora", referindo-se ao seu corpo como "musical e estranho e perfumado". Mas Nora será sempre, antes de tudo, a "minha flor azul-marinho encharcada de chuva", uma das imagens mais recorrentes na coletânea. "A alma dela! O nome dela! Seus olhos! Eles são para mim como estranhas e belas flores selvagens azuis que crescem em alguma sebe emaranhada e encharcada de chuva", escreve ele num momento de raro lirismo. E, anos depois, durante meses separados por centenas de quilômetros, entre Dublin e Trieste, recordando os anos passados juntos, ele escreveria: "Ó, não foi o desejo carnal, caríssima, não foi a loucura desenfreada e brutal de que te escrevi nestes últimos dias e noites, não a cobiça selvagem e bestial de teu corpo, caríssima, o que me atraiu em ti então e que me prende a ti agora. Não, caríssima, não é isto absolutamente e sim o amor mais terno, cheio de piedade e adoração por tua mocidade e criancice e fraqueza. Ai, a dor gostosa que puseste no meu coração! Ai, o mistério de que tua voz me fala!" Uma paixão sem freios, admiravelmente sintetizada numa arrebatadora sentença que, ao colocar, lado a lado, os extremos da consciência do artista, pretende, através da devoção à mulher amada, expurgar os fantasmas do seu passado: "Como detesto Deus e a morte! Como adoro Nora!"

        De fato, a vida de Joyce esteve indelevelmente marcada por Deus e pela morte, graças a experiências vividas na infância e na juventude, que ele relata, com rancor, em uma de suas primeiras cartas: "Meu espírito rejeita toda a ordem social presente e o cristianismo - o lar, as virtudes reconhecidas, categorias sociais e doutrinas religiosas. Meu lar era simplesmente um negócio de classe média arruinado por hábitos perdulários que eu herdei. Minha mãe, creio, foi morta aos poucos pelo mau trato de meu pai, por anos de tribulação e pela franqueza cínica de minha conduta. Ao olhar para o rosto dela quando posta no caixão - rosto cinzento devastado pelo câncer - tive consciência de estar olhando para o rosto de uma vítima e amaldiçoei o regime que fizera dela uma vítima." E, logo a seguir, referindo-se ao catolicismo: "Há seis anos deixei a Igreja Católica, tendo por ela o ódio mais fervoroso. Foi-me impossível ficar dentro dela devido aos impulsos de meu gênio. Quando estudante declarei-lhe uma guerra secreta e recusei-me a aceitar as posições que ela me ofereceu."

        Ele sublimaria tais sentimentos através da literatura, mas o ódio à Igreja Católica também ganha contornos jocosos em suas cartas, por exemplo, ao referir-se a si mesmo como "teu Irmão-Cristão-em-Luxúria" ou ao sentenciar, sem admitir réplicas: "Em virtude dos poderes apostólicos de que estou investido por Sua Santidade o Papa Pio Décimo dou-lhe por meio desta a permissão para vir sem saia, receber a bênção Papal que terei o prazer de lhe dar."
        Esse homem permanentemente intranqüilo carregava em si uma sensualidade que certamente não é incomum, mas à qual ele concedeu, traduzindo-a em palavras, o signo da imortalidade. Ele se utiliza de comparações inusitadas: "...mas ficaria muito mais feliz ainda se me desses um daqueles beijos chupados que gostas tanto de me dar. Fazem-me lembrar canários cantando." Revela uma imaginação infatigável e um indisfarçável romantismo: "Vejo-te em centenas de poses, grotesca, vergonhosa, virginal, langorosa. Entrega-te a mim, caríssima, todinha, quando nos encontrarmos. Tudo que é sagrado, oculto aos outros, tens de me dar sem reservas. Quero ser o senhor de teu corpo e alma." Por vezes, parece enlouquecer num frenesi de saudade: "Meu bem, meu bem, hoje sinto um desejo tão louco de teu corpo que se estivesses aqui ao meu lado e mesmo que me contasses com tua boca que metade dos cafajestes de cabelo vermelho do condado de Galway tinham fodido contigo antes de mim eu ainda me atiraria em ti com ardor." Enquanto escreve, muitas vezes masturba-se: "Meu bem, neste instante eu ejaculei nas minhas calças de modo que estou inteiramente fora de combate." E angustia-se, moralmente dividido, revelando a influência negativa do cristianismo, da qual ele nunca conseguirá, totalmente, se livrar: "Eu me pergunto se haverá alguma loucura em mim. Ou será amor, loucura? Num momento eu te vejo como uma virgem ou madona e no momento seguinte te vejo despudorada, insolente, seminua e obscena!"
Lingeries
        O Joyce fetichista emerge em quase todas as cartas. Ele detesta os corpetes: "É favor deixar de lado aquela couraça, pois não gosto de abraçar uma caixa de correio." E reitera, dias depois: "Não deixes de dar a Miss Murphy aquele corpete de carabineiro - e creio que podias também dar-lhe de presente todo o uniforme de carabineiro. Por que usas essas coisas malditas?" Contudo, revela um cuidado especial com certos detalhes: "Tua luva passou toda a noite ao meu lado - desabotoada - mas quanto ao mais comportou-se muito bem." Lembrando a Nora, na mesma carta: "Espero que ponhas minha carta na cama como convém."
        O mesmo cuidado ganha dimensões inusitadas quando se trata das lingeries: "Dizes que queres que minha irmã te leve daqui umas roupas de baixo. Por favor, não faças isso, querida. Eu não gosto que ninguém, nem mesmo uma mulher ou uma moça, veja as coisas que te pertencem. Eu gostaria que fosses mais cuidadosa em não deixar certas roupas tuas por aí, quer dizer, quando voltam da lavadeira. Ó, eu queria que mantivesses todas essas coisas secretas, secretas, secretas. Queria que tivesses grande quantidade de roupas de baixo de toda sorte, de todos os matizes delicados, guardadas num enorme armário perfumado." Há, mesmo, um exaspero na profusão de detalhes e na forma repetitiva com que ele os descreve: "Gostaria que usasses calças com três ou quatro babados por cima do outro nos joelhos e nos quadris e grandes laços vermelhos neles, quer dizer, não calças de estudante com uma beirada de renda pobre e escassa, apertada nas pernas e tão fina que a carne aparece entre elas, mas calças de mulher ou (se preferes a palavra) de senhora, de fundo solto cheio e pernas largas, todas de babados e rendas e fitas e carregadas de perfume, de modo que quando quer que as mostres, seja ao levantar depressa a roupa para fazer uma coisa ou ao te agachares lindamente para seres cravejada, eu só veja um amontoado crescente de fazenda branca e babados e de modo que quando eu me debruço por cima de ti para abri-las e te dar um beijo ardente e sensual na tua travessa bunda nua eu cheire o perfume de tuas calças juntamente com a emanação quente de tua cona e o odor pesado de teu traseiro." E há uma constante jovialidade, uma alegria ímpar em todos os seus freqüentes pedidos: "Compra calças para putas, meu amor, e não te esqueças de derramar um bom perfume nas pernas delas e também desbotá-las um pouquinho atrás."
Um menino mau
        As expressões do amor de Joyce por Nora estão vincadas de figuras edipianas, que nos permitem perceber, além da crescente dependência do artista por sua mulher, o quão multifacetada pode ser uma relação na qual os preconceitos não encontram espaço.

        Ele anseia, muitas vezes, por voltar ao útero materno: "Em breve meu corpo vai penetrar no teu, oxalá que minha alma o pudesse também! Oxalá que eu pudesse aninhar-me no teu útero como uma criança nascida de tua carne e teu sangue, ser alimentado com teu sangue, dormir na quente penumbra secreta de teu corpo!"

        E, como um filho travesso, deve ser castigado: "Se esta sujeira que escrevi te ofende faz-me novamente voltar à razão com o chicote como já fizeste antes. Deus me acuda!"

        Sim, há também um James Joyce masoquista, igualmente inebriante ao expressar seus desejos de submissão e maus-tratos: "Sou teu filho, como te disse, e deves ser severa comigo, minha mãezinha. Castiga-me tanto quanto queiras. Eu ficaria encantado de sentir minha carne debaixo de tua mão. Sabes o que quero dizer, Nora querida? Quero que me dês pancadas ou mesmo que me açoites. Não de brincadeira, querida, de verdade e na minha pele nua. Eu queria que fosses forte, forte, querida, e tivesses seios grandes, cheios e empinados e coxas grandes e gordas. Eu adoraria ser chicoteado por ti, Nora, amor! Gostaria de ter feito qualquer coisa que te desagradasse, mesmo qualquer coisa de trivial, talvez um de meus hábitos um tanto sujos que te fazem rir; e então ouvir-te chamar-me para dentro de teu quarto e então encontrar-te sentada numa poltrona com as coxas gordas bem separadas e a cara vermelha de raiva e uma vara na mão. Ver-te indicar o que eu tinha feito e então com um movimento de ódio puxar-me para perto de ti e atirar-me atravessado no teu colo de rosto para baixo. Então sentir tuas mãos arrancando minhas calças e roupas de baixo e levantando minha camisa, e me debater entre teu colo e teus braços fortes, e te sentir inclinar-te (como uma ama zangada surrando a bunda de uma criança) até que tuas maminhas grandes e cheias quase me tocassem e sentir-te açoitar, açoitar, açoitar furiosamente minha trêmula carne nua!"
O corpo, os odores nauseabundos, as fezes
        As cartas, coletadas no período entre 1904 e 1912, encadeiam-se num jorro de crescente sensualidade. Poucas partes do corpo parecem não excitar Joyce. Pouquíssimas não são citadas. Mas há uma notável preferência pelo sexo anal e por todos os barulhos e odores que brotam do ânus. "Há um lugar que eu gostaria de beijar, sabes, um lugar esquisito, Nora. Não nos lábios, Nora. Sabes onde?", interroga ele numa das primeiras cartas.
        Obstina-se pelas regiões mais escondidas da mulher, por seus perfumes e suas secreções: "... no âmago deste amor espiritual que tenho por ti há também um desejo bestial e bruto por todos os pedacinhos de teu corpo, todas as partes secretas e vergonhosas dele, pelos cheiros todos dele e por tudo o que ele faz." Uma insistência que se repete em inúmeras cartas: "Diz-me os menores detalhes a teu respeito contanto que eles sejam obscuros e secretos e porcos." Ou, num tom um pouco mais terno: "As duas partes de teu corpo que fazem coisas sujas são as mais adoráveis para mim."

        A mera lembrança dos peidos de Nora exerce sobre ele um poder devastador: "Naquela noite, bem, tua bunda estava cheia de peidos, e com a foda eu os fiz sair, grandes e gordos, prolongados e cheios de vento, estalinhos rápidos e alegres e uma porção de peidinhos pequeninos e travessos que terminavam num jorro demorado por teu buraco. É maravilhoso foder uma mulher peidorreira quando cada metida faz sair um." E mostra-se um exímio definidor, quase criando uma classificação por tipos ou gêneros: "Penso que eu reconheceria um peido de Nora em qualquer lugar. Penso que poderia distinguir o dela numa sala cheia de mulheres peidando. É um barulhinho bem de menina, não como o peido molhado e cheio de vento que imagino ser o das esposas gordas. É inesperado e seco e indecente como o que uma menina atrevida soltaria de pândega num dormitório de colégio à noite. Espero que Nora nunca pare de soltar peidos na minha cara para que eu fique conhecendo também o cheiro deles."

        De excitar-se com o barulho e o odor dos peidos de Nora, ele caminha, sutilmente, numa sucessão meticulosa de vontades, para a coprofilia: "Meu amor por ti me leva a orar ao espírito de ternura e de beleza eterna de que teus olhos são o espelho ou a te derrubar debaixo de mim sobre esta tua barriga macia e te foder por trás, como um cerdo cobrindo sua porca, incensado com o próprio fedor e suor que saem de teu ânus, incensado com a vergonha patente de teu vestido levantado e as calças brancas de menina e com a confusão de tuas faces enrubescidas e teu cabelo emaranhado. Isso me faz romper em lágrimas de piedade e amor por qualquer palavrinha, tremer de amor por ti ao som de algum acorde ou cadência musical ou ao deitar-me contigo pé com cabeça sentindo teus dedos a acariciarem e fazerem cócegas no meu saco ou enfiados em mim por trás e teus lábios quentes chupando meu pau enquanto minha cabeça está inserida entre tuas coxas gordas, com as mãos grudadas nos coxins redondos de tua bunda, eu lambo com voracidade tua cona vibrante e vermelha. Ensinei-te a quase desmaiar quando ouves minha voz cantando ou murmurando à tua alma a paixão e a tristeza e o mistério da vida e ao mesmo tempo ensinei-te a fazer trejeitinhos indecentes com a língua e os lábios, a excitar-me por meio de toques e ruídos obscenos, e até a fazer na minha presença o ato mais sujo e vergonhoso do corpo. Lembra-te do dia em que levantaste a roupa e me deixaste ficar deitado por baixo de ti vendo-te fazê-lo? Depois ficaste com vergonha de me olhar nos olhos."

        Joyce erotiza as palavras escritas por Nora. Ele vai além da carga semântica dos termos, exigindo que os signos tenham, no papel, um aspecto realçado, marcante... E, por fim, não satisfeito, sugere a mancha real do objeto do seu fetiche, impossível de ser substituído por palavras: "Escreva mais e com mais sacanagem, querida. Esfrega o teu grelo enquanto escreves para te fazer dizer coisas cada vez piores. Escreve as palavras feias em grande, sublinhando-as e beija-as e encosta-as por um instante em tua deliciosa boceta quente, querida, e também levanta o vestido por um instante e coloca-as debaixo de tua cara bundinha peidorrenta. Faz mais se quiseres e então manda-me a carta, minha adorada paloma de cu escuro."

        Quase ao fim do volume, a coprofilia explode nas missivas, exalando o calor e a viscosidade das entranhas de Nora: "Fode-me se puderes agachada no toalete, de roupas levantadas, grunhindo como uma porca nova a defecar, e um troço grande grosso sujo serpenteante a descer lentamente de teu traseiro."
        Do que se percebe nas cartas, Nora participava ativamente das fantasias de Joyce. Alimentava-as, até. Numa das últimas cartas, ensandecido, ele atinge o paroxismo da libidinagem, encerrando seu texto abruptamente e proclamando, em êxtase, ser incapaz de prosseguir: "Cagar agora te faz ter tesão? Não sei como podes fazê-lo. Gozas no momento de cagar ou te masturbas até gozar primeiro e depois cagas? Deve ser algo de terrivelmente excitante ver uma mulher de roupa arregaçada esfregando furiosamente a boceta, ver suas bonitas calças brancas abertas atrás com a bunda aparecendo e um troço gordo e escuro saindo a meio caminho pelo buraco. Dizes que vais cagar nas calças, querida, e então deixar que eu te foda. Eu gostaria de te ouvir cagá-las, querida, primeiro - e depois foder-te. Uma noite quando estivermos em algum lugar no escuro e falando sacanagem e sentires que tuas fezes estão a ponto de sair passa os braços ao redor de meu pescoço com vergonha e vai cagando devagar. O ruído me enlouquecerá e quando eu puxar teu vestido para cima                             Não adianta continuar! Podes calcular porque!"
O que restou
        "Tu te tornaste parte de mim - uma carne." Assim, o escritor sintetiza seu amor pela menina pobre, empregada de hotel, que ele conhecera em 10 de junho de 1904. Joyce morreria em 1941 e Nora dez anos depois.
        O criador de um novo cosmos literário, cuja obra, ultrapassado o século, permanece como um sistema aberto às mais instigantes indagações, deixou-nos também, semelhante àquelas flores que as mocinhas costumavam guardar no meio dos livros, a lascívia que nasceu inspirada por sua "flor azul-marinho", de quem ele escreveu, certa vez: "Eu já senti a alma dela tremer junto da minha, e já murmurei o nome dela baixinho para a noite, e já chorei ao ver a beleza do mundo passar como um sonho por trás dos olhos dela."

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