Quando eu era moleque, fazia um jogo comigo mesmo com os sentidos. Tal qual cego. Tal qual cão guia. Tal qual sensitivo, eu buscava ampliar meus outros: olfato, tato, paladar, audição e sensação.
Caminhava pelas ruas olhando as pessoas e tentando adivinhar o que pensavam. Absolvidas em suas próprias vidas - passavam por mim, e eu sugava do ar os seus perfumes e suas compreensões. Era capaz de dizer algo sobre essa alma, só pela sensação que dava.
Em outras vezes eu passava a mão pelos troncos das árvores, a fim de captar o que diziam. De volta do colégio, ficava tateando os muros e paredes, tentando sentir o ambiente e as suas lembranças. Sim, certas moradias possuem uma história contada e recontada da nossa própria história como pessoas que ao passar por um lugar deixa marcada uma lembrança.
Em cima do meu próprio telhado eu fechava os olhos e ouvia o mundo, procurando nos sons diversos aquele som único – quase indecifrável! Cansei de tomar banho de olhos fechados, tateando o banheiro para achar o xampu.
Passei boa parte do meu tempo de criança e adolescência me orientado por coisas que não via – só sentia – era um jeito de não me contaminar com as precipitações das pessoas que gostam de dar nomes e razões a tudo. Eu chegava a minha casa no tempo certo de sentir o cheiro do bife fritando por minha mãe.
Acordava pelo perfume do café, sentia seu humor pelo timbre da sua voz, percebia o mundo ainda com os olhos fechados, teimava em abri-los para não perde a magia da compreensão das coisas sem ver.
Perdi meus poderes quando quis ser adulto comprometido com as pessoas e não elas comigo.
RESOLVI IGNORAR MEUS SENTIDOS E ACREDITAR QUE O REAL É O QUE QUEREMOS QUE SEJA REAL.
O certo é uma palavra acostumada com promessas que não se cumprem. Mas, o certo mesmo é como minha filha mais velha antevê, perguntando “Se estou bem?” sabendo o que sinto antes mesmo de me ver.
Ignorei os sentidos para dar razão às palavras das pessoas que expressam uma coisa e fazem outra. Ignorei a minha sensitividade para não acusar o outro de uma mentira que vai contar em poucos instantes. Enfim , eu acreditei em tudo que ouvia da boca das pessoas para não dizer que sou diferente. O que é uma bobagem completa. O melhor dos mundos é o que você pode compreender pela sua própria sensação. A melhor das verdades é aquela que sorri pelos olhos, formando uma curvinha de alegria que palavra alguma descobre. A melhor das intenções é aquela que a pessoa senta junta sem dizer nada e não arreda o pé até saber se você esta bem. De resto- fique com seu mundo dos OLHOS.
Crônicas do dia a dia, frases, pensamentos e curiosidades
segunda-feira, 3 de agosto de 2020
Os cincos sentidos da alma
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