quarta-feira, 6 de novembro de 2019

A prótese dele me ensinou mais um capítulo.

Resultado de imagem para prótese da perna




Faz tempo que eu não abria um sorriso fácil, e hoje isso aconteceu, graças ao Seu Geraldo da borracharia. Eu sempre fui cliente dele, mas há dois anos que ele suspendeu suas atividades, o motivo: Seu Geraldo é diabético, perdeu parte da perna. Fez uma cirurgia que removeu o pé até altura do joelho. Todos os dias em que vou trabalhar no centro eu passo de lado da borracharia, mas nunca mais tinha visto ele, desde o dia que soube da cirurgia. Era uma quinta-feira e parei logo cedo em sua borracharia, eu esperava como sempre atencioso, mas desta vez não tinha macaco hidráulico na rua, não tinha pneus e nem nada que lembrasse que estava aberto, bati palmas de frente, porque sei que ele mora ao lado do serviço, na esperança de vê-lo, porém, quem saiu foi a esposa, e me disse: “ Geraldo não pode trabalhar mais! Geraldo cortou a perna até o joelho por causa da diabetes...”. Ao fundo eu via seu Geraldo olhando para tv, numa cadeira de balanço, ainda nos curativos, com olhar fixo em direção do que passava naquele momento, nem ao menos girou o pescoço para me ver, coisa que duvido que ele não soubesse de mim, eu deveria ter sido mais um das dezenas de clientes que iam todos os dias para saber de seus serviços e acabavam absolvendo a notícia.
Nada mais disse, apenas liguei o carro e fui embora... Ao longo desses dois anos, sempre passei olhando para a borracharia, e por muitos meses, tudo fechado... Até que vi virar uma Capotaria, depois Oficina, mas nada do Seu Geraldo aparecer, sempre novos donos, novos negócios naquele mesmo local. Um belo dia acabou que o vi cruzando a Pedro II, em pé, meio desequilibrado, aprendendo a andar de prótese. Mas, era já um começo, e tinha sido assim quase que semana sim e não, vendo-o andando e cruzando a rua, agora já mais firme.
Hoje foi diferente! Hoje havia a placa de Borracharia aberta, lá estava seu Geraldo com suas ferramentas e seu macaco hidráulico levantando um carro, observei tudo isso parado no semáforo, ele sentado com a perna da prótese toda esticada, realizando aquilo que gostava de fazer. Foram poucos segundos em que pude observar a cena mais significativa dos últimos dias... Vi um velho homem que havia perdido sua felicidade e seu trabalho, ressurgir sozinho, mesmo depois da idade que aparentemente tem, voltando a acreditar na vida, aprendendo que tudo se modifica ou que o fim não é absoluto, não é sinal que a luta foi perdida, nem que por não ser fácil, a vida não mereça continuidades. Merece sim! A expressão dele não era a mesma de antes da cirurgia, era melhor: Era de uma gratidão profunda, da autossatisfação que nos move, faz os homens embevecidos pela oportunidade da segunda chance. Algo que só quem perde algo sabe gratificar a quem do céu permitiu se sentir útil de novo.

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